As armas protegem as mulherem?
- Nina
- 24 de jul. de 2020
- 3 min de leitura
Atualizado: 25 de jul. de 2020
Depois que o presidente assinou o decreto que flexibiliza a posse de armas de fogo, a deputada federal Joice Hasselmann (PSL/SP) divulgou um vídeo que foi produzido e gravado nos Estados Unidos em que aparece com uma pistola e um fuzil praticando tiro. O vídeo foi publicado nas suas redes sociais para comemorar a aprovação do decreto. A deputada escreveu ainda que esse é só o “1º passo” e que vai lutar ao lado de Bolsonaro para liberar o porte de armas. “A mulherada do meu país andará em cima do salto e com sua arma”, publicou Hasselmann no Twitter, afirmando que assim ela faz nos Estados Unidos. “Está emergindo um discurso e existe uma grande ilusão de que há empoderamento para as mulheres através das armas, mas é sempre importante lembrar que um elemento importante para o crime é a surpresa e que a pessoa que quiser te atacar sempre estará em vantagem”, pontua Roberta Astolfi. Para a pesquisadora, as armas não podem ser vistas como forma de prevenção e nem de combate à criminalidade: “Segundo a legislação, as mulheres podem ter acesso a posse e porte de armas de fogo. Não se trata de impedir, mas que se tenha em mente o que significa uma maior circulação de armas”, alertou. O estímulo para que as mulheres se armar para combater a violência de gênero só faria com que aumentasse a violência em toda a sociedade e fosse estimulada uma política de violência por reação, na análise de Wânia Passinato: “O que temos que garantir para as mulheres é que elas não sofram violência e não que elas tenham que ter recursos como armas para reagir à violência com outra violência”. Outro ponto levantado pelas especialistas ouvidas pela Gênero e Número é que, historicamente, quem detém a posse de armas são os homens e que as mulheres não têm armas e nem se defendem dessa forma. “Nas violências domésticas e familiares contra as mulheres existe uma relação de extrema desigualdade, dependência financeira e emocional. Essas relações fazem parte de um ciclo de violência, do qual as mulheres não conseguem sair e muito menos se defender, ainda mais com uma arma de fogo”, disse a coordenadora do Nudem, Maria Matilde Alonso Ciorciari. Ela também afirma que são raros os casos em que essa reação acontece.
Suspensão de posse e porte na Lei Maria da Penha
A Lei Maria da Penha (Lei 11340/06) prevê como uma das medidas protetiva de urgência a suspensão da posse e do porte de arma do agressor. Como a autorização da posse de armas é dada pela Polícia Federal e é a Polícia Civil que investiga os casos de violência de gênero, é necessário que a mulher entre com uma solicitação junto à Polícia Civil para a suspensão da posse e informe os dados do agressor. “O controle [da medida protetiva] ainda é muito frouxo, não funciona bem e nem é articulado. Deveria haver uma checagem, mas como não há, as mulheres precisam denunciar e entrar com o pedido de suspensão”, pontua a pesquisadora do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, Após a assinatura do decreto presidencial, a Defensoria Pública de São Paulo formulou, por meio do seu Núcleo Especializado de Promoção e Defesa dos Direitos das Mulheres, um modelo de solicitação de medida protetiva que suspende a posse e o porte de armas por quem tenha histórico de violência doméstica e familiar. A solicitação será distribuída a todos os defensores públicos e busca visibilizar o dispositivo e o acesso das mulheres vítimas de violência.
*Vitória Régia da Silva é jornalista e Natália Leão é pesquisadora e analista de dados da Gênero e Número.
** Os dados para esta reportagem foram obtidos pela equipe da Gênero e Número responsável pela construção do projeto Mapa da Violência de Gênero, que faz parte da segunda geração de projetos apoiados pela ALTEC e será lançado em breve.

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